Naquele mesmo quarto, ainda acendo o abajur
antigo, e sento na velha poltrona estofada em couro preto – que muito bem
conhecíamos–. Fumo o meu charuto, bebo amargamente a minha dose de conhaque e
ligo a vitrola. À medida que a agulha encontra o disco, e as notas fluem, mais
me afundo em mágoas e recordações, derramando lágrimas cheias de saudade. Ainda
falta você.
Noite de Dezembro de 1987.
As ruas estavam muito bem iluminadas devido a
enorme quantidade de pisca – pisca que coloriam a cidade, trazendo graça e uma
ótima sensação. As crianças cantavam canções natalinas, os meninos soltavam
rojões, as famílias tomavam sorvete na praça. E nós, a caminho do meu
apartamento.
Uma excitação, um beijo de
chegada. As chaves giram e a porta é fechada com o impacto do nosso encosto.
Nossas roupas, no chão. Beijávamos e íamos derrubando tudo, até chegar ao
quarto.
A meia luz do abajur a deixava muito mais
alva, e seus olhos, muito mais esverdeados. Impressionava-me o quão rosados e
delicados eles eram. Perfeitamente de acordo com o resto do corpo. Seus longos
cabelos negros beiravam as suas costas, marcada pelo seu quadril e a
sua cintura, tão fina.
Seu silêncio cochichava em meus ouvidos,
penetravam, revelavam muito mais do que você poderia – se estivesse em
condições- dizer.
Minha bela, minha menina, minha
companheira de teatro. Sabia tanto de mim, conhecia meus mais profundos
desejos, mesmo sem que eu relevasse-os.
A janela, escorria pelo nosso
calor. E hoje, de olhos fechados, posso recordar o seu beijo, toque e
olhar-chumbo-, penetrante.
Incontestável, mulher de satanás. Surrealmente
perfeita, paradoxalmente maquiavélica. Aos céus, e ao inferno levava-me.
Aquela música, aquele quarto.
Qual o sentido, senão você?
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